Ele,
eu e os relatos do cárcere
Aprendendo a ser criança?
Hum, entendo...
Um medo doido de bicho
papão, de escuro...
Um medo de ficar sozinho,
pra dormir, em casa ou na vida?
Crescemos, você deve
responder, não sentimos mais essas coisas. E eu respondo: Será mesmo?!
Se é uma lição valiosa que
aprendemos é conviver com o medo.
Eu mesmo já me despedi de
vários...ah, pronto falei!
Caso você ainda carregue os
seus como eu, esse escrito veio em boa hora.
Pesos e culpas não
valem... aqui falamos de medos...
Desses que a gente pensa
não sentir mas que travam a vida, não deixam nada fluir.
Parece que nada é tão
ameaçador do que não sermos nós mesmos...cravamos o pé no que achamos que somos
por puro medo.
Medo diverso, difuso,
misturado no tudo e no nada...
Falei nada com nada e
acabei acertando o seu medo, certo?
Ah, me perdoe...não tento
ser invasiva...aqui apenas percamos os medos de dividir, compartilhando
estórias das nossas histórias.
E como o espaço cabe todos
os medos, eu vou arriscar falar de alguns dos meus...
Eram tantos que não caberiam
na crônica..., mas, no fim, somando todos juntos numa só conta era o medo de
viver.
Deixa eu contar como era a
prisão e depois, o relato da fuga, melhor assim?!
Não sei falar quando
começou, só seu que foi assim durante anos... presa numa visão de que o medo me
protegia.
Criando cada vez mais
filhotes de si, ele me deixava algemada às suas mãos, pernas e pés...me
impedindo de caminhar.
Noutro tempo, ele fechava
meus olhos, distorcendo minha visão dos fatos, acontecimentos e pessoas.
Esperto que só, o medo
tapava meus ouvidos na intenção de que ouvisse apenas as vozes dele e de seus
sucessores.
Num dia, a prisão
particular ficou sem o carcereiro...
O medo de “ser eu” deixou
seu posto por falta de pagamento...
Saiu sem sequer trancar as
portas... deixou a luz do dia entrar e eu aproveitando a oportunidade fugi.
Nesse dia, nem assisti ao
noticiário para não sentir medo de voltar a ser quem eu não era.
Os dias foram passando, o
cotidiano se fazia mais bonito e os medos foram desistindo de mim.
Talvez por terem outros
prisioneiros ou reféns, não sei ao certo.
Só sei que a cada dia me
faço mais forte...melhor e me sentindo bem em minha própria pele.
Dia desses tive um plano,
quer saber?!
Estando bem, eu reunirei
mais pessoas como eu... numa boa rebelião de bem.
E qual a missão, você
pergunta? Vamos tirar das garras do medo... todos aqueles que querem viver.
E aí, posso contar com
você ou não?!
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